domingo, 24 de abril de 2011

IGREJAS E O DIREITO DE VIZINHANÇA

Há alguns meses já abordamos esse assunto, mas vou relembrar o fato que aconteceu a apresentar novos elementos para a administração desses desagradáveis eventos envolvendo igrejas.

Estávamos, há alguns anos, eu e minha esposa, em pequena cidade no interior do Estado de São Paulo, apresentando uma conferência para líderes evangélicos, pastores e alguns políticos, no plenário da Câmara Municipal, e um dos participantes, ao final, apresentou a seguinte questão:

Sou o pastor de uma determinada igreja que fica localizada na praça central de minha cidade, e mandei instalar alguns altofalantes para anunciar o evangelho e tocar nossos belos hinos para a vizinhança ouvir. Acontece que existem dois vizinhos implicantes que estão causando problemas, alegando que o som alto está atrapalhando suas atividades normais, tais como assistir TV ou descansar. O Dr. não acha que isso é perseguição religiosa e estão ferindo meu direito de liberdade religiosa?
Em outra igreja na Capital Paulista, houve até mesmo a intervenção policial para resolver questão semelhante e nos foros apropriados, onde somos convidados a discutir tais assuntos, “liberdade religiosa”, “direito de vizinhança”, “lei do silêncio” e outros, apresentamos a resposta com a necessária precisão técnica e jurídica, mas, neste momento desnecessária, pois ofereceremos a resposta que o bom senso e as Sagradas Escrituras nos apresentam.

E nossa resposta àquele líder foi que seria muito sensato ele visitar seus vizinhos e procurar saber se as atividades de sua igreja não estariam incomodando, não somente o som alto, mas o estacionamento de automóveis impedindo e dificultando a saída de sua garagem, o acúmulo de lixo, e o comportamento dos adolescentes e crianças da igreja, entre outros itens a serem aferidos na relação com seus vizinhos.

Na verdade ninguém gosta de morar ao lado de uma igreja, qualquer que seja, nem mesmo seu pastor (com raras exceções). Conheço um pastor que mora em São Vicente, e no pavimento térreo do prédio onde mora funciona uma igreja, dessas bem barulhentas, e após ele reclamar do alto som, chegou mesmo a ser ameaçado pelos “irmãos” daquela igreja.

Os hinos que a nós nos parecem verdadeiros cantos angelicais, para o vizinho, que tem um senso estético completamente diferente e muitas vezes mais elaborado, pode achar simplesmente pavoroso.

Portanto, nossa resposta, sem nos atermos aos aspectos técnicos jurídicos, é que, por favor meu irmão, preste atenção no seu vizinho, veja se o agente perseguidor não será você com sua intolerância e falta de respeito com o cidadão. Seja o exemplo de cidadania e respeito ao próximo tal como o Senhor Jesus ensinou.

Cícero Duarte

sexta-feira, 22 de abril de 2011

ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS, ONGS E TERCEIRO SETOR

Delimitamos como objeto de nossas reflexões, as organizações religiosas, e estas especialmente em relação ao Estado, enquanto sociedade politicamente e juridicamente organizada, ou seja tratamos não de igrejas em seus aspectos religiosos, mas sim em seus aspectos institucionais e jurídicos, e quando é feita essa abordagem surgem outras terminologias ou termos que não têm sua origem necessariamente no direito e eventualmente, em razão de terem origem em outras ciências tais termos provocam algumas imprecisões na linguagem.

O Código Civil Brasileiro define as pessoas jurídicas em duas grandes espécies: a) pessoas jurídicas de direito público e, b) pessoas jurídicas de direito privado. Como exemplos da primeira espécie existem as empresas públicas, as autarquias, a União Federal, os Estados, Distrito Federal e Municípios, todas essas pessoas jurídicas são de direito público. E como exemplo de pessoas jurídicas de direito privado é todo o restante, ou seja, as associações, fundações privadas, sociedades, organizações religiosas e partidos políticos.

O texto legal (Código Civil Brasileiro) não usa as expressões “ONG’s” e “terceiro setor”, a primeira teve sua origem nas ciências sociais e a segunda nas ciências econômicas, e não nas ciências jurídicas, mas, em que pese não serem termos definidos em lei, foram assimilados pelo direito em sua construção doutrinária e jurisprudencial. Portanto tais termos não são utilizados no texto legal, mas eventualmente são utilizados nas ciências jurídicas.

Pois bem, vejamos a utilização de tais termos e suas relações com as organizações religiosas.

Organizações não governamentais, como o nome indica são as organizações que não tem a participação do poder público (“governamentais”) em sua instituição, mas que atuam subsidiariamente em funções que são primariamente de competência de uma pessoa jurídica de direito público, tal como educação, proteção ao idoso e à mulher, e outras mais. Tais organizações não podem gerar lucro, e seus beneficiários não deverão remunerar pelos serviços que lhes são oferecidos.

As ciências econômicas nos brindaram com o termo “terceiro setor”, observamos que tal termo foi cunhado dentro do contexto da economia, juntamente com “primeiro e segundo setores”. Primeiro setor é o setor público da economia, segundo setor é o setor da economia privada na busca do lucro, e terceiro setor é todo o restante, ou seja o que não for público e privado com a finalidade de lucro é terceiro setor. Existem doutrinadores minoritários e que são exceções e que defendem a posição de que a mídia e as fundações seriam os quarto e quinto setores. Mas, de acordo com a definição clássica certamente podemos incluir as organizações religiosas no terceiro setor.
Pois bem, dessa maneira podemos entender que organizações religiosa não são “ONG’s” porque não tem atuação primordialmente de competência do poder público, e mesmo porque a Constituição Federal em seu artigo 19 veta expressamente que o poder público institua ou contribua com qualquer tipo de culto e expressão de fé, insculpindo dessa maneira o princípio da laicidade do Estado, ou seja, se ao Estado é proibido qualquer atuação em questão de fé e organizações religiosas são precipuamente para regular a expressão de fé de algum grupo de pessoas, certamente estas não tem objetivos ou finalidades de competência primaria do Estado e portanto não podem ser consideradas como “ONG’s”.

De outra feita, o termo “terceiro setor” se aplica ao setor da economia que não é público e que não é decorrente da iniciativa privada na busca de lucro, e vimos acima que organizações religiosas nada tem haver com o setor público e que não podem e nem devem ter como objetivo e finalidade o lucro, de modo que são pessoas jurídicas típicas de terceiro setor.

Pois bem, conforme já expusemos em postagens anteriores, em que pese não existir a definição legal de organizações religiosas, certamente estas tem natureza jurídica semelhante a uma associação, pois são reuniões de pessoas que não tem finalidade econômica, e agora vemos que não são ONG’s e que são exemplos típicos de pessoas jurídicas pertencentes ao terceiro setor da economia.

Cícero Duarte