quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

O TEMPLO AMARELO E A ASSEMBLÉIA GERAL

(O princípio da competência eficaz)

Soube da notícia de que a pintura do templo de uma determinada igreja batista no estado de São Paulo havia sido interrompida em razão dos critérios para a escolha da cor!!! Meu Deus!!!
Na verdade a prosaica escolha da cor que levou ao desagrado foi apenas subterfúgio para se reclamar de que estavam decidindo sem que houvesse a reunião da igreja na forma de Assembléia Geral.
Todos desejavam ser ouvidos! Afinal isso sim é democracia!
Vamos considerar a questão sob o olhar jurídico institucional: seria necessária a convocação de uma Assembléia Geral (AG) para se discutir a cor do templo? A rigor, se o estatuto da igreja assim determinasse, seria sim! Mas, caso não determinasse, desnecessária tal AG. Até poderia acontecer, caso não lhe fosse proibida pelo mesmo Estatuto.
Agora vamos considerar a questão, que chega mesmo a ser cômica, olhando suas verdadeiras motivações, de acordo com três observações a seguir.
Em primeiro lugar, se eu não sou especialista, não tenho capacitações ou dons para escolher cores de templos, posso até me manifestar de acordo com minha construção estética: gosto do amarelo ou não, não suporto templo marrom ou não, esse azul é muito feio, ou simplesmente acho que o branco seria adequado! Vejam bem, NÃO sou especialista em identidade visual, comunicação, estética, etc., mas darei ou não minha opinião, de maneira informal, descomprometida.
Mas, e se a questão a ser discutida for uma questão contábil ou financeira (vejam bem, também sou igualmente leigo na área contábil e financeira, pois fui formado técnico em direito e são coisas diferentes), dependendo do problema a ser resolvido certamente deverá ser ouvida a área técnica pertinente ao assunto. Isto também quer dizer que no momento da escolha das pessoas a preencherem os cargos de diretoria previstos no Estatuto, também se deve levar em conta a possibilidade técnica de quem irá assumir esta ou aquela função.
Por exemplo, com certa freqüência uma irmã caridosa, de oração, acima de qualquer suspeita e quem sabe aposentada (pois assim terá tempo para exercer a função) da escola pública onde lecionou história durante trinta e cinco anos, acaba sendo eleita para o cargo de primeira tesoureira. Ora, uma pessoa nestas condições, que está habituada a gerenciar um orçamento familiar ou pessoal de aproximadamente R$ 2.000,00 mensais, certamente não terá a possibilidade técnica para gerenciar a tesouraria de qualquer tipo de instituição, quer seja pela natureza e particularidades completamente diferentes da função, quer seja pelos valores envolvidos ou por ambos os fatores.
No momento de escolher, por exemplo, o secretário, obrigatoriamente deverá ser alguém que tenha habilidade de redação, domine o vernáculo, e que esteja acostumado a uma certa organização, se assim não for, o ocupante do cargo estará fadado ao fracasso e a Igreja certamente sofrerá grandes constrangimentos.
Em segundo lugar: quem sabe somente na Igreja tenho o espaço emocional que necessito para ser ouvido. Certamente você já deve ter participado de uma AG onde alguém pede a palavra para discutir assunto absolutamente irrelevante e que poderia ser discutido em outro foro, mais informal e de maneira menos onerosa. Pois bem, às vezes a pessoa que age dessa maneira não tem qualquer outro lugar onde possa ser ouvida, e precisa sentir-se reconhecida de alguma maneira e utiliza o espaço da AG para isso. Caso me veja assim, preciso ser devidamente tratado e caso perceba alguém assim, devo ser cuidadoso para não oprimir mais ainda quem está agindo dessa maneira. Trate com cuidado para não ferir suscetibilidades.
E em terceiro lugar, Assembléias Gerais para escolha da cor de templo nada têm haver com a forma como Jesus gerenciava seu grupo de seguidores, que, aliás, nada tem em comum com a democracia que exercitamos na maioria das igrejas. Vejam o evento das multiplicações dos pães[1]: Jesus, foi sensível à necessidade da multidão, percebendo a fome do povo, gerenciava o processo, mandava dividir o povo em grupos, escolheu pessoas (evidentemente pessoas que teriam a possibilidade de carregar os peixes e pães) para fazer a distribuição, em fim, distribuía tarefas para quem podia executá-las de maneira eficiente, ou seja de maneira a atingir o objetivo proposto, a saber alimentar o povo.
E, por fim, sugira, quando necessário, a criação de comissões com competência (ou seja, compostas de preferência com especialistas) para decidir sobre aspectos juridicamente irrelevantes da vida da Igreja, mas que são historicamente, liturgicamente, teologicamente, sociologicamente ou eclesiologicamente relevantes para a Igreja. Tais comissões são bons e democráticos instrumentos para gerenciar o dia a dia de uma Igreja, mesmo que seja uma igreja de pequeno porte.
Cada pessoa carrega em si determinadas competências (dons) e características, e tais competências somente se tornarão eficazes se forem utilizadas no local e momento adequado e tal princípio deverá ser observado pela Assembléia Geral no momento da escolha de quem irá servir à igreja, utilizando-se de uma função ou cargo.
Portanto, se você não é competente para decidir sobre a cor do templo, deixe para quem conhece do assunto e não atrapalhe a vida da Igreja.



[1] Evangelho de Marcos, cap. 6, vers. 35 a 44 e cap. 8, vers. 1 a 9

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